25.6.13

E agora, Doutor?


(Sobre o poema José de Carlos Drummond de Andrade)
 
E agora, Doutor?
A ilusão acabou,
a luz apagou,
o povo chiou,
a noite esfriou,
e agora, Doutor?
e agora, você?
você que é sem prestigio,
que socorre os outros,
que faz o que pode,
que diagnostica, prescreve?
e agora, Doutor?

Está sem dormir,
está sem saúde,
está sem autoridade,
já não pode tratar,
já não adianta insistir,
transferir já não pode,
a noite chegou,
o substituto não veio,
o parecer não veio,
o exame não veio,
não veio a esperança
e a adrenalina acabou
e o culpado fugiu
e o futuro mofou,
e agora, Doutor?

E agora, Doutor?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?

Com a resposta nas mãos
quer abrir caminhos,
não existem caminhos;
quer reanimar,
mas desanimou;
quer ainda tentar,
chances não há mais.
Doutor, e agora?

Se você lutasse,
se fizesse greve,
se você fugisse
pro pantanal matogrossense,
se você desistisse,
se você parasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, Doutor!

Sozinho no escuro
de seu consultório,
sem ter esperança,
sem ter alegria
para trabalhar,
sem saber que caminhos
seguir, desnorteado
você marcha, Doutor!
Doutor, para onde?

Um comentário:

Splanchnizomai abraçando o amanhã. disse...

...para os braços de Jesus. E ser tudo o que Ele propõe.