25.11.03

Sonetinho Desapontado
(ou: Cecilia Meirelles tinha razão...)

Foi instalado no Hospital de Guarus um relogio de ponto que funciona mediante registro da impressao digital dos funcionários. Um must de tecnologia num país de banguelas. A fila interminavel de funcionários que entravam e saiam do Hospital cruzando pela nova maquininha gerou o maior pandepá. E a poesia se fez presente. Ou o médico chega e começa o atendimento e esquece o ponto ou entra na fila do ponto e ignora o atendimento...

Se eu começo o atendimento, atraso o ponto...
Se eu bato o ponto, atraso o atendimento...
Se eu não passo o cartão, ganho um desconto...
Se eu não atendo é um descontentamento...

E assim eu sigo, um tanto o quanto tonto...
Uma dúvida atroz me rói por dentro:
Eu largo a Emergencia e marco o ponto
Ou largo o ponto e abaixo o vencimento?

O ponto ou a Emergencia? A febre ou o ponto?
O ponto digital ou o sangramento?
Ó duvida cruel... Eu não aguento...

Como é que eu faço? Com quem eu conto?
Será que tem que ser assim e pronto?
Quem é que muda esse regulamento?

19.11.03

O Coração

O coração, sem freio, sem cadeado,
Não reconhece mão ou contra-mão.
Não sabe nunca o que é certo e o que é errado.
Caminha por ai sem proteção.

Não tem defesa. Não é murado.
Vai desarmado. É a sua condição.
Não leva má intenção e é descuidado.
Escolhe sempre errado o sim e o não.

Não tem palavras. Bate calado
Dentro do peito, trancado
Feito um inconfidente na prisão...

Por não ter muros, vive espalhado...
Por não ter freios, desabalado...
Por não ter olhos, não tem perdão

16.11.03

Um poeminha

Eu faço verso de um palavreado.
Que é coisa breve, Quase sem som.
De rima improvisada e sem pecado.
De um pensamento de desejo bom.

Eu faço verso de não dizer nada.
Nenhuma novidade. Nenhum brilho.
Como quem reinventa a caminhada.
Como quem redescobre o próprio trilho.

Eu faço verso de pequena rima,
De poesia tosca e pequenina,
De pés descalços, tocando o chão...

Eu faço verso de motivo aguado
Que não tem tranca nem cadeado
E nem tem freios no coração...

10.11.03

O pomar
Após escutar o novo CD de Lô Borges

Um dia, se eu tiver merecimento,
E for morar em Milton Nascimento,
Eu vou catar um cesto só de acordes
No pomar de Lô Borges...

4.11.03

As trinta gramas
João Geraldo nasceu com aproximadamente 1200 gramas. Nos 10 primeiros dias de vida chegou a pouco mais de um quilo. Hoje, por volta de 1350 gramas, percorre um lento caminho até a alta. À nosso pequeno homenzinho, este poema.

Mil trezentos e vinte... Mil trezentos e cincoenta...
As trinta gramas essenciais...
A progressão, que é vagarosa e lenta...
As trinta gramas a mais...

Sessenta, setenta, oitenta... Então noventa...
Tão pouco e tanta diferença faz...
Como se fosse a medalha de quem tenta...
As trinta gramas fundamentais...

E a cada grama, um Everest inteiro...
Como quem cruza a fronteira... Como quem chega em primeiro...
Como quem ganha a carta de alforria...

As trinta gramas de felicidade...
As trita gramas buscando a liberdade...
As trinta gramas a mais de cada dia...