13.7.07

Somos mamiferos

Somos mamiferos
Do mesmo modo que o são
O cão e o gato,
A ovelha, o coelho, o lobo,
O lince, a vaca,
O canguru, a paca,
O leão,
O chimpanzé e o rato...
Mamiferos,
Dependentes dos ductos lactíferos
Do mesmo modo que o são os dromedários,
Nossos irmãos de hábitos mamários,
Como também o camelo,
O leão-marinho,
A anta,
O mico-leão-dourado,
A onça parda,
A onça pintada,
O quati,
O tamanduá
E o leopardo...
Que coisa boa:
Mamiferos como a leitoa
E os bacurinhos,
E quase, como eles, tão lindinhos...
Somos mamiferos
Como o elefante africano,
Da mesma forma que o rinoceronte...
Alimentamo-nos da mesma fonte
Que o texugo mama
E onde também a lhama...
Dependuramo-nos na mesma mama...
Irmãos da mesma livre demanda
Da ratazana,
Da jaguatirica,
Do gato do mato
E do urso panda...
E embora apaixonados por teorias,
Por técnicas, controversias, prós e contras,
Somos mamiferos
Como são os lobos, quem diria,
E os hipopótamos,
Os javalis e as lontras...
Como o morcego lanudo
E o ratinho caseiro,
Somos da mesma forma atraidos pelo cheiro
Do leite de peito.
E não tem jeito:
Somos mamiferos.
Alimentamo-nos das mesmas mamas cheias
Do modo como se alimentam as baleias,
E da mesma maneira
Que alimentam-se a toupeira
O gorila
E o boto,
E o rato-do-campo-de-rabo-curto,
O tatu-peba, se não me engano,
E ainda o tigre siberiano...
Do mesmo modo que eles
Nós mamamos...
Mesma atração instintiva por mamilos
Que possuem os veados e os esquilos,
E da mesma forma que a baleia-anã,
Nossa irmãzinha,
Somos os filhos da apojadura
Como o arminho,
Como a doninha,
Como a fuinha...
Somos os donos da proxima mamada
Como os sacarrabos,
Como os gatos bravos,
Como a onça bastarda...
Somos mamiferos,
E como nossos irmãos de peito
Sobrevivemos aos milenios do mesmo jeito:
Ninho, aconchego, calor,
E leite quente,
Naturalmente...
E muito embora
Aparentemente
Mais inteligentes,
Nós, homo-sapiens,
Não nos enganemos:
Do mesmo modo que os irmãos que temos,
Que mamam da mesma forma que o fazemos,
E crescem do mesmo modo que crescemos,
A mesma mama,
A mesma sucção,
Por que é que ainda não nos convencemos?
Somos mamiferos...
Por que é que tanta gente acha que não?

9.7.07

A graça

Que graça teria a vida
Se não houvesse a poesia?
Nascer, viver, morrer,
Misturar-se à terra fria,
Tornar-se um Fisico, um Quimico,
Um Doutor em Pediatria,
Um Pós-graduado em Farmácia,
Um Professor de Biologia,
Our concour em Matemática,
Um Mestre em Fisioterapia,
Que graça, me diz, que graça
Se não houvesse a poesia?
Ganhar bastante dinheiro,
Trabalhar dia após dia,
Fazer amigos, casar-se,
Ver aumentar a familia,
Viajar o mundo inteiro
Numa imensa romaria:
Ir do Rio à Nova Iorque,
De Nova Iorque à Bahia,
Da Bahia ao Himalaia,
Do Himalaia à Hungria,
Da Hungria à Machu Picchu,
De Machu Picchu à Turquia,
Da Turquia até Passargada,
De Passargada à Utopia,
De Utopia à Montes Claros,
Dali à Santa Maria,
Aprender mil idiomas,
Mil costumes, mil manias,
Conhecer gentes e modas
Saber de Reis e Rainhas,
Fotografar paisagens
Que jamais ninguém havia...
Trazer o mundo no bolso...
Mas que graça isso teria
Sem a graça de poder
Rimar cotia com tia,
Ler um verso de Quintana,
Ter Castro Alves como guia,
Carlos Drummond como amigo,
Ferreira como companhia,
Chico Buarque como Mestre,
Vinicius como Sinfonia,
Bandeira como delirio,
Pessoa como terapia,
Mário de Andrade como ouro,
Gulherme de Almeida como prataria,
Augusto dos Anjos como astro,
Cecilia como maravilha...
Que graça teria a vida
Se a vida tivesse tudo
Mas caminhasse esquecida
Da poesia?