22.4.02

A forma leve da solidão

Não há limites para a poesia.
Nenhuma absolvição para quem escreve.
Nem mérito nenhum. Nem companhia.
O poema é a solidão na forma leve.

Não há descuido nem desarmonia.
Nem diferenças entre o Sol e a Neve...
Não há fidelidade. Não há guia.
A letra nunca diz o que não deve.

Não há disfarce. Tudo é permitido.
O dar. A dor. A dança. O doido. O dia.
A voz escancarada e a voz discreta.

Na poesia tudo faz sentido.
Não há limites para a poesia
Nem há perdão nenhum para o poeta...
A Ingratidão

"O beijo, amigo, é a véspera do escarro...
A mão que afaga é a mesma que apedreja"...
Augusto dos Anjos


Não deixa a ingratidão, essa vadia,
Fazer morada no teu coração...
Contaminar a tua poesia...
Sair despedaçando a tua razão...

E mesmo quando, por hipocrisia,
O beijo de carinho for traição
E a mão gentil que afaga e acaricia
Apedrejar-te sem explicação,

Não deixa a ingratidão, coisa pequena,
Fazer morada no teu poema
Contaminando a tua emoção...

Supera a ingratidão. Não vale á pena.
A ingratidão é como uma gangrena...
Lança teu vôo e alcança a imensidão...

15.4.02

A lágrima

Não há vergonha alguma na tristeza
Nem desacerto, desmerecimento...
A lágrima é o balde da limpeza
Do coração lavando o pensamento...

A lágrima é, talvez, na Natureza,
A gota mais suave e mais ousada:
Faz parte do olhar triste da Princesa
E da feição da moça favelada...

Há os que são tristes por muito tempo...
Os que entristecem e depois melhoram...
E os que a tristeza ainda há de encontrar...

A lágrima é a voz do pensamento...
Não há tolice alguma nos que choram...
Nenhum motivo de se envergonhar...

8.4.02

A Gratidão

Não há demérito algum no agradecer,
Nem há vergonha na gentileza...
Nenhuma impropriedade em receber
Nem desacerto na delicadeza...

Não há nenhuma contra-indicação
No bem-estar do favorecimento...
Nem há sinal de inadequação
Na comoção do agradecimento...

Reconhecer o gesto de carinho,
Compreender o ato de favor,
Saber ficar feliz na boa ação,

Não é vergonha. Não é desalinho.
Não é humilhação. Não causa dor.
É a divida do amor. É a gratidão.

2.4.02

Estupidez

Não há delicadeza na agressão
Nem gentileza na palavra má...
Não há leveza na desatenção...
Nenhuma educação em maltratar...

E na palavra farta de mentira,
E na atitude desrespeitosa,
E no sarcasmo, e no rancor, na ira,
E na traição, na frase maliciosa,

Não há carinho. Só mediocridade.
Não há nenhuma forma de beleza.
Só dano, desacerto, insensatez...

Somente quase sempre impropriedade.
Palavra fluindo contra a correnteza.
Pecado sem perdão. Estupidez.