29.6.04

O Coronel e o Inferno

_Poeta, Poeta!!! Não me mande para o Inferno!!!
Disse-me uma vez um Coronelzinho...
Mas como eu faria isso se o Inferno
É um lugar pra onde se vai sozinho?

Tem gente que vai pra ele bem depressa...
Tem gente que vai bem devagarinho...
Tem gente que já segue em linha reta...
Tem gente se perde no caminho...

O fato é que o Poeta não condena...
Um poeminha é coisa tão pequena...
Diante de um Inferno é tão fraquinho...

Pro inferno vai quem planta o pecado
Aonde era pro bem ter sido semeado...
Mas ele ainda não sabe... Coitadinho...

25.6.04

Distraçao
Para Bruna, Santa Maria, RS, apos sua foto passeando na beira mar admirando surfistas... (www.fotolog.net/brubruzynha)

O surfista, dentro d'agua,
Tentando a sua onda cheia,
Vagueia velozmente, feito arraia...
Distraido, nao repara na Sereia
Maravilhosa e divina que passeia
Na beira
Da areia
Da praia...

Sonetinho cheio de Saudade
Para minha amiga Carla Cristina (www.fotolog.net/anginhaa)

Se eu fosse fazer silencio da saudade que te sinto,
Seria o certo nunca mais falar,
Silencio imenso, fundo e duradouro,
Silencio quase de nem respirar...

Se eu fosse fazer silencio do tamanho da saudade
Seria assim, como me ausentar,
Silencio feito o silencio de quem dorme
Um sono leve e calmo... E sem roncar...

Por isso troco o silencio por riminhas,
Dessas riminhas de agradar anginhas...
O verso diz ser ter que pronunciar...

Mas se eu fosse fazer verso a cada saudade, guria,
Eu não parava mais de escrever poesia...
E ai sim, voce ia se cansar...

21.6.04

O Dia da Colheita
Versos para a ingratidão...

A colheita acabou. Não sobrou nada.
Um cheiro ácido. Um sabor estranho.
Um gosto cru de terra desmatada,
De agua pouca e ruim e imprópria ao banho.

E o que era a colheita planejada,
Safra multiplicada, lucro, ganho,
O tempo fez tornar-se terra amarga,
Deserto inominado e sem tamanho...

A colheita acabou. Restou o luto.
A folha seca no lugar do fruto,
E, no lugar do adubo, a folha morta...

A semente parecia tão bonita...
Mas era só casca... Mas era só fita...
Mas era só coisa feia e torta...

17.6.04

Oração pelas criancinhas

Pai do Céu, protegei os nossos filhos,
E os nossos netos, e os nossos sobrinhos,
E as criancinhas carentes de afetos,
E as criancinhas dos nossos vizinhos,

E as menininhas da Guatemala,
E os menininhos do Paquistão,
E as criancinhas filhas de ouro e gala,
E as criancinhas filhas do Alcorão,

Crianinhas pretas, brancas, amarelas,
Abençoai-as, Pai, e as das favelas,
E as que padecem nos Hospitais,

Abençoai, Senhor, as criancinhas,
As bem nascidas e as prematurinhas
E as que não sabem o que é ter paz.

16.6.04

Dias assim

Os dias nublados parecem tristes.
Parecem dias que não tem cor.
As nuvens perdem os seus contrastes.
Olhar o céu perde seu sabor.

São tristes dias os de céu nublado.
São feitos de horas quase sem fim
Aonde o azul, quase acinzentado,
Parece pronunciar um nome ruim.

Por tão nublados, nem parecem dias.
Tempos propícios às ventanias.
Murmurios convidando à solidão.

Dias nublados parecem longe,
Lembrando um céu quando o céu se esconde
Dentro de gotas feitas de não...
Sonetinho aos intolerantes...
A intolerancia assassinou Cristo.
Semente do holocausto nazista, a intolerancia morrerá um dia do próprio veneno...


Tem gente que não tolera poesia.
Tem gente que não tolera a coisa certa.
Tem gente que não tolera a luz do dia.
Tem gente que não tolera a casa aberta.

Tem gente que não tolera companhia.
Tem gente que não tolera a linha reta.
Tem gente que não tolera a própria cria.
Tem gente que não tolera a própria meta.

Tem gente que não tolera, então conspira.
Tem gente que não tolera, então atira.
Tem gente que não tolera, e discrimina.

Tem gente que não tolera e se condena.
Tem gente que não tolera e se envenena.
Tem gente que não tolera e se elimina.

15.6.04

A neblina

Quem espalhou a neblina em meu caminho?
Quem embaçou, desse modo, a minha visão?
E assim também essa falta de carinho
Com que direito me embaça o coração?

7.6.04

Resposta à Rita
Ao ler o poema Versos para os urubus uma leitora, Rita, pergunta em seus comentários:
E será que vale a pena ter coração?!
E para que não fique sem resposta...


Não vale à pena ter coração.
Diz a razão que não vale à pena.
O coração é que é o grande senão
E ao mesmo tempo é como um poema:
É quase feito de fragilidade,
Depositário de coisa pequena,
Caminha com grande dificuldade
E passa a vida a nos causar problema.
Por isso, respondendo à sua razão
Para que conste no seu teorema:
Não vale à pena ter coração.
Mas ninguem é feliz pela razão.
Esse é o dilema.
A razão pode trazer conforto,
Um bem estar qualquer de coisa amena.
Felicidade não. Pois é. Que Pena.
O coração, por sua vez, é um azarão
Que chega de repente e rouba a cena.
Nenhuma razão imita
Essa simplicidade extrema:
O coração, por nunca ter razão,
Caminha acima do valer à pena.
Por isso é que valendo à pena ou não
Ainda que incomode a sua razão
O coração é lei que tem por lema
Permanecer além da conclusão,
Ser a condenação do que o condena,
Ser muito além dessa inutil discussão,
Pois se a razão condenou,
O coração
Foi quem tratou com perdão à Madalena.

Voce pergunta se vale a pena
Ter coração...
E eu te respondo em forma de poema:
Pode ser que valha não...
Mas cara Rita,
A razão sem coração
Parece coisa tão tola
E tão pequena...

4.6.04

Versos para os urubus

I
Os urubus se alimentam de restos e sobras,
Pedaços de visceras, postas de mão,
Os urubus se contentam com partes e lascas,
Os urubus se contentam com podridão...

Procuram a matéria apodrecida e fria,
Procuram a matéria em decomposição,
Ou urubus preferem a porcaria,
Os urubus desprezam o coração...

E assim, vivendo de resto e posta,
Se alimentando do que ninguem gosta,
Os urubus e sua condição...

Buscam o resto, o infecto, o putrefeito,
Os urubus e seu soturno jeito,
Buscando o nojo. O perfeito não.

II
E o coração que os urubus recusam
Na sua vida de danação,
É o que escapa, e permanece intacto,
É o que resiste à degradação.

E o coração, intacto e recusado
Por não ser troço em decomposição,
Por não ser resto, por não ser lixo,
Por não ser musculo em putrefação,

Acaba por tornar-se um gem guardado,
O germen do futuro, preservado,
A resistencia, que é nunca em vão...

O coração do corpo destroçado.
O coração, tesouro resguardado.
Semente de esperança, o coração...

III
O coração que os urubus recusam.
O coração que permanece inteiro.
O coração, quase despercebido.
O coração, quase como um guerreiro.

O coração que os urubus ignoram.
O coração, presença diminuta.
O coração, morada dos que choram.
O coração e sua força absoluta.

O coração que os urubus nem sabem
Porque no peito de urubus nem cabem
O coração e a sua força imensa.

O coração, gigante adormecido,
Que é pelos urubus despercebido.
O coração que faz a diferença.




A Felicidade que nunca cessa...

A minha felicidade escapa à toa...
Escapa à toa e permanece em mim
Assim como é a Fonte de água boa,
Como é o sol... Mais ou menos assim...

A minha felicidade escapa e fica,
E cada vez que escapa, aumenta mais...
Como a bactéria que se multiplica,
Do jeito como quando escapa o gás...

Feito um esguicho de chafariz,
A felicidade que me faz feliz
Do mesmo modo faz feliz quem me rodeia...

Felicidade que escapa e permanece,
Do mesmo modo que é o poder da prece,
Da mesma forma que a Lua Cheia...

2.6.04

Oração pelas fofoqueiras
Há os que trabalham em Hospitais e passam seu tempo trabalhando.
E há os que não tem ou não sabem o que ou como fazer e passam seu tempo fofocando...



Senhor,
Abençoai o Corpo de Enfermagem,
Dai luz às faxineiras e às copeiras,
Cuidai dos funcionários da Triagem
Mas dai um jeito nas fofoqueiras...

Guiai, Senhor, nossos motoristas,
Curai os abcessos e as frieiras,
Abençoai as nossas Nutricionistas
Mas dai um jeito nas fofoqueiras...

Iluminai nossos Diretores,
Guiai a mão dos nossos Doutores,
Evitai brigas e choradeiras...

E protegei nossos pacientes,
Cuidai da ira dos descontentes
Mas dai um jeito nas fofoqueiras...
Amém...