28.6.13

Experimente

Experimente dar plantão num hospital estragado,
Que não deixe você fazer o que precisa fazer,
Experimente assim, o corredor lotado,
Sem UTI pra quem corre o risco de morrer,

Experimente. Sem remédios, raios x quebrado,
Você sabendo fazer, mas sem poder,
Experimente. Estressado e com salario atrasado,
Sofrer pra tratar de quem quer parar de sofrer...

Contrate então médicos cubanos,
Espanhóis, portugueses, incas venusianos,
Experimente pra ver o que vai acontecer...

Desmoraliza e humilha o medico brasileiro
Que tem tentado o que pode o tempo inteiro...
Faz isso hoje e amanha vai se arrepender...

E se...

Em seu discurso à nação na sexta, 21 de junho, a Presidenta Dilma anuncia o anuncio da importação de milhares de médicos para resolver os problemas de saúde do Brasil...
 
E se ao invés de médicos, paciência?
E se ao invés de médicos, credibilidade?
Quem e que acredita nessa incoerência?
Quem tem paciência com tanta leviandade?

E se ao invés de médicos, decência
E alguns containers com moralidade?
E desse jeito: imediatamente e com urgência,
Tamanha é a nossa necessidade...

E se ao invés de médicos, Deputados,
Visto que os nossos parecem infectados
De um mal que não tem cura ou livramento?

E se ao invés de médicos, Presidenta,
Porque e que Vossa Excelência não experimenta
Importar um outro pronunciamento?

25.6.13

E agora, Doutor?


(Sobre o poema José de Carlos Drummond de Andrade)
 
E agora, Doutor?
A ilusão acabou,
a luz apagou,
o povo chiou,
a noite esfriou,
e agora, Doutor?
e agora, você?
você que é sem prestigio,
que socorre os outros,
que faz o que pode,
que diagnostica, prescreve?
e agora, Doutor?

Está sem dormir,
está sem saúde,
está sem autoridade,
já não pode tratar,
já não adianta insistir,
transferir já não pode,
a noite chegou,
o substituto não veio,
o parecer não veio,
o exame não veio,
não veio a esperança
e a adrenalina acabou
e o culpado fugiu
e o futuro mofou,
e agora, Doutor?

E agora, Doutor?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?

Com a resposta nas mãos
quer abrir caminhos,
não existem caminhos;
quer reanimar,
mas desanimou;
quer ainda tentar,
chances não há mais.
Doutor, e agora?

Se você lutasse,
se fizesse greve,
se você fugisse
pro pantanal matogrossense,
se você desistisse,
se você parasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, Doutor!

Sozinho no escuro
de seu consultório,
sem ter esperança,
sem ter alegria
para trabalhar,
sem saber que caminhos
seguir, desnorteado
você marcha, Doutor!
Doutor, para onde?

22.6.13

É o que basta...

Pra me representar não precisa ser letrado,
Nem ser inteligente, nem ter dinheiro,
Nem ser esperto, nem andar todo arrumado,
Nem ser repentista, nem ser pagodeiro...

Pra me representar não precisa ser meu aliado,
Nem concordar comigo o tempo inteiro,
Também não precisa colar do meu lado
Como um fiel escudeiro...

E não pode ser raivoso, intolerante,
Incomplacente, deselegante,
Bajulador, baba-ovo, baderneiro...

Tem é que querer ser feliz dia após dia,
E nem precisa gostar de poesia,
Precisa gostar é de ser brasileiro...

Simples assim...

Chico Buarque me representa,
Também a poesia. de Vinícius de Moraes,
Da mesma forma a mãe prematura que amamenta,
E meus irmãos, e meus pais,

E a minha praia de Atafona que me alenta,
E os versos que eu escrevo, tolos demais,
E a Escola Jesus Criso, que minha família frequenta,
E os meus amigos de décadas atrás...

Agora: gente que se revela intolerante,
Gente irritada, gente arrogante,
Gente que parece que tem o rei na barriga,

Gente assim eu não curto nem adiciono,
Nem deixo que me faça perder o sono,
Nem permito que me oriente ou que me siga...