11.2.02

Um poeta, Manoel de Barros...
Carnaval no Brasil...
Escondido num apartamento na Praia do Flamengo eu descobri o mundo.
Minha irmã, meu amor, me mandou há alguns dias uma página de Manoel de Barros.
Manoel de Barros...
Aprendi poesias com meu pai...
Li Castro Alves...
Casemiro...
Li Vinicius...
Li Gullar...
Cecília...
Augusto dos Anjos...
Drummond...
Bandeira...
Eu me perdi na métrica confusa e salvadora de Mário de Andrade...
Torquato Neto...
Conheci os jaguadartes Augusto e Haroldo de Campos...
E a poesia imensa de Chico Buarque...
Mas Manoel de Barros eu não o conhecia...
E de modo algum isso me deixou triste ou impaciente...
Quisera descobrir de tempos em tempos Manoeis de Barros que a vida não me apresentara quando eu presumo que deveria ter apresentado...
Aqui no Rio, sábado de carnaval, os Shoppings ainda abertos...
Numa livraria, descansando e iluminando a prateleira, um volume:
Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo...
Autor?
Manoel de Barros...
E a delicadeza de suas palavras trazem o peso de uma verdade infinita...
A poesia de Manoel não foi feita para ler...
Mas para respirar...
Passar na pele...
Dormir...
Sonhar...
É carnaval no Brasil...
Manoel de Barros foi aqui a minha fantasia preferida...

A Disfunção
Manoel de Barros

Se diz que há na cabeça dos poetas um parafuso a menos
Sendo que o mais justo seria o de ter um parafuso trocado do que a menos.
A troca de parafusos provoca nos poetas uma certa disfunção lírica.
Nomearei abaixo 7 sintomas dessa disfunção lírica.
1. Aceitação da inércia para dar movimento às palavras.
2. Vocação para explorar os mistérios irracionais.
3. Percepção de contigüidades anômalas entre verbos e substantivos.
4. Gostar de fazer casamentos incestuosos entre palavras.
5. Amor por seres desimportantes como pelas coisas desimportantes.
6. Mania de dar formato de canto às asperezas de uma pedra.
7. Mania de comparecer aos próprios desencontros.

Essas disfunções líricas acabam por dar mais importância aos passarinhos que aos senadores.

A Pedra
Manoel de Barros

Pedra sendo
Eu tenho gosto de jazer no chão.
Só privo com lagarto e borboletas.
Certas conchas se abrigam em mim.
Dos meus interstícios crescem musgos.
Passarinhos me usam para afiar seus bicos.
Às vezes uma garça me ocupa de dia.
Fico louvoso.
Há outros privilégios de ser pedra:
1. Eu irrito o silencio dos insetos.
2. Sou batido de luar nas solitudes.
3. Tomo banho de orvalho de manhã.
4. E o sol me cumprimenta por primeiro.

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