26.3.07

Gostar é assim...

Gostar é assim mesmo.
Indefinido.
Nem sempre dois e dois
Ali
São quatro.
Às vezes é tudo culpa do cupido.
Outras, do excesso de salto
No sapato.

Gostar é assim mesmo.
Ora atrevido.
Ora tão cheio de dedos
E recato.
Às vezes é como um naufrago
Perdido.
Às vezes è como um cisne
Amar um pato.


Gostar é assim então.
Complicadinho.
Tem quem goste só pouquinho
Mas tem quem goste
Pela vida inteira.


Gostar é por vezes
Cheio de carinho.
Por outras vezes
É gostar sozinho.
Mas sempre é bom.
De qualquer maneira.

17.3.07

Para minha irmã

Anjos não fazem aniversário.
Não surgem. Não vão embora.
Não são classificados pelo calendário.
Não tem data. Não tem dia. Não tem hora.

Anjos são simplesmente atemporais,
Não tem formato ou aspecto definido.
Anjos são todos iguais:
São assim mesmo, não fazem ruído...

Anjos padecem e superam crises,
Regeneram rapidamente cicatrizes,
As suas e as outras, dos queridos seus...

Anjos são sempre assim: leves, discretos,
Ao mesmo tempo suaves e diretos...
Anjos são Anjos. Acima deles, só Deus.

4.3.07

O caminheiro...
Durante sua longa jornada de Nazaré até Belém, José e Maria, esta grávida do menino Jesus, cruzam em seu caminho, a certa altura da estrada, com um caminheiro que deles se aproxima, olha-os de perto, troca com eles discreto cumprimento e segue adiante, mas não os reconhece...

Caminheiro, seguindo pela estrada,
Quando cruzares pelo caminho
Com um homem, uma mulher embarrigada
E um burrinho,

Se não notares, nessa hora, nada,
E prosseguires, sozinho,
Continuando tua caminhada
Devagarinho,

Terás perdido a chance a ti cedida,
Talvez a única da tua vida,
Talvez a mais importante...

Quando, de novo, José e Maria?
Quando, de novo, esse dia?
Quando, dali pra diante?

3.3.07

Maria e Isabel
Naqueles dias, levantou-se Maria e foi apressadamente à região montanhosa, a uma cidade de Judá. Luc 1, 38

Assim que soube da historia do ocorrido,
Maria foi ter com Isabel, como relatado.
Por que com pressa Maria teria ido?
Que tempo juntas terão passado?
Apressadamente, teria Maria fugido?
Ou apressadamente, espírito extasiado?
Que coisas Maria com Isabel terá aprendido?
Que coisas Maria a Isabel terá ensinado?
Terão cortado e lavado que tecido?
Que alimentos terão preparado?
Que frutos terão colhido?
Que sementes semeado?
Terão os meninos, em seus ventres, remexido?
E os primos, nos ventres das primas, se agitado?
Que hinos, juntas, terão ouvido?
Que coisas belas terão cantado?
Que orações terão dito?
Que versos terão de clamado?
Quantas vezes a Deus terão bendito?
Quantas vezes a Deus magnificado?
Isabel e Maria... Como terá sido?
Como esse tempo terá passado?
Quantas noites de sono bem dormido?
Quantas de sonho acordado?
Ansiosas, terão emagrecido?
Encantadas, terão engordado?
Que coisas, nesse tempo, terão lido?
A quem terão visitado?
Quem as terá conhecido?
Terão com quem conversado?
Quem é que terá merecido
Esse agrado?
Com que gentes terão tido
Contato?
Quem soube do acontecido
E a quem terá revelado?
Que tantas coisas terão sentido?
Por que outras tantas terão passado?
Como terão convivido
Maria e Isabel, lado a lado?
Dois ventres pelo Espírito Santo concebidos...
Dois ventres absolutamente sem pecado...
Maria e o apoio do seu marido...
Isabel e o filho tão desejado...
Que coisas terão vivido?
Que coisas terão falado?
Que coisas terão permitido?
Que coisas terão recusado?
O que terá havido
Por aqueles lados?
O que as montanhas de Judá terão sabido?
O que as montanhas de Judá terão guardado?
Poema de Natal
Adaptação para estilo poético da "Oração de Natal" do volume "Um poema para o Natal", publicado em 2005 pela Editora Scortecci.

I
Recorda a Humanidade, neste dia
Os fatos que cercaram tua chegada:
O Anjo anunciando-te à Maria,
José quando acolheu a sua amada

De Nazaré a Belém, tua romaria,
Onde não havia vaga na pousada,
O teu nascimento numa estrebaria,
A manjedoura, tua primeira morada...

Recorda a Humanidade, entre louvores,
Os Anjos anunciando-te aos pastores,
Os magos e Herodes, a adoração e o medo...

Recorda a Humanidade nessa hora
Os primeiros movimentos da tua estória
Imensa e encantadora desde cedo...

II
Desde aqueles dias
Já se vão dois mil anos...
Do mesmo modo
Como os pastores,
Aqui estamos...
Soubemos da Boa Nova
E aqui viemos
Como fizeram os pastores
Há dois mil anos...
E, como os pastores,
Nós nos sabemos
Pobres seres humanos,
Nada possuímos
Nem trazemos,
Como os pastores
Há dois mil anos...
Não viemos,
Como os pastores,
Tão logo e assim que soubemos...
Nós nos atrasamos...
Mas aqui estamos
Na tua presença e,
Por tão pequenos,
Silenciamos...
E assim, orando,
Nós nos ajoelhamos,
Como os pastores
Nós nos alegramos,
Como os pastores
Há dois mil anos...

III
E aqui estamos de mãos vazias...
O que intencionávamos trazer perdemos
Com companhias, com teorias,
Com coisas que valiam menos...

E aqui estamos. Não trazemos nada.
O que tínhamos ficou pelo caminho.
Nós nos dispersamos pela caminhada
E caminhamos em desalinho...

E aqui estamos. Nada trazemos.
Nem mirra, nem ouro e nem incenso...
Pelo caminho nós os perdemos
E nos restou esse vazio imenso...

E aqui estamos. Nós nos dispersamos.
Nós nos atrasamos. Mas aqui viemos.
Já se passaram mais de dois mil anos
E ainda não aprendemos...

Aqui estamos. Ajoelhados.
De mãos vazias. Em pensamento.
Aqui estamos, muito cansados,
Diante do teu nascimento.

IV
O ouro que traríamos,
Valioso,
Peça imponente,
Belíssima cor,
Recebeu tantas ofertas
Nesses dias
Que o trocamos
Sem nenhum pudor
Por bugigangas,
Quinquilharias,
Sem garantias,
Coisas sem valor:
Bijouterias,
Peças sem valia,
Pedras sem brilho
E sem nenhum teor...
Gastamos todo
Com ninharias,
Trocamos,
Demos
E esquecemos
De repor...
Hoje não temos
Mais do que a lembrança
Do que já tivemos
E, alem disso,
Dor...
E porque gastamos,
E porque perdemos,
Comportamo-nos
Como o mau pastor
Que se descuida
Do que seria
Para cuidar
Como bom cuidador...
Aqui estamos
De mãos vazias,
Nada mais temos,
Nada nos restou...
De mãos vazias
Aqui estamos...
Vazios
Na presença
Do Senhor...

V
O aroma leve de um suave incenso
Nós preparamos para trazer.
Aspecto doce, odor delicado,
Especificamente preparado
Para o menino que viemos ver.

Foi quando ate aqui, pelo caminho,
Outros aromas doces conhecemos,
Por outros cheiros nos atraímos,
Outras essências sentimos,
Outras fragrâncias colhemos

E o aroma leve do incenso suave
Que preparamos foi se perdendo
E como a água quando escorre pelo ralo
Já não nos é possível agora identificá-lo...
_O que é que andamos fazendo?

Por outros cheiros nos seduzimos,
Outros perfumes vulgares,
Azedos, acres, fáceis, sedutores,
Odores oferecidos, maus odores,
Dezenas e centenas e milhares...

E assim o símbolo de tua espiritualidade
Contaminamos em nossa caminhada...
Estúpidos condutores, e descuidados,
E incautos, fomos contaminados
E hoje trazemos a alma infectada...

E o aroma suave do incenso doce
Já não possuímos nesse momento...
Envolve-nos, Senhor, com tua essência,
Ajoelhados, na tua presença,
Reverenciando teu nascimento...

VI
A mirra, preparamos com carinho
E embalamos cuidadosamente...
O sofrimento é parte do caminho...
A dor é sempre presente...

Mas dono de um cuidado tão mesquinho,
De um jeito tão displicente,
Bastou o primeiro copo de vinho
E o primeiro gole amargo de aguardente

E a mirra a derramamos e a perdemos,
A dor embriagada dói bem menos...
Desrespeitamos teu sofrimento...

E hoje aqui, não mais tão embriagados,
Postamos-nos diante de ti, ajoelhados,
Diante do teu nascimento...


VII
Submersos em trevas e isolados,
Por desacertos nos conduzimos...
Enfraquecidos, tolos, derrotados
Que a nós mesmos nos destruímos...

A sombra, como semente alimentada,
Cresceu e se espalhou, erva daninha...
A Humanidade quedou-se, acinzentada,
Perdeu o rumo, perdeu a linha...

O desafeto e o desamor, unidos,
Tornaram-se gestos diários
Que os homens fracos e os distraídos
Trataram como comportamentos necessários...

E assim, do desamor nasceram a usura,
A ira torpe, a falta de perdão,
O ódio entre a criatura e a criatura
E a rudeza do coração...

Mísseis cruzando os céus, caças insanos,
Botões dizimando nações sem piedade,
Homens selvagens, seres humanos
Vestidos de pura bestialidade...

A morte provocada pela guerra,
O lucro à custa da crueldade,
A sombra assustadora sobre a Terra
Ameaçando a Humanidade...

Flagelo. Fome. Miséria. Medo.
Terror. Suspeita. Desamparo. Dor.
O homem que vive entre feras desde cedo
Fica contaminado por esse horror.

A que chegamos... Não sobrou nada.
Nenhuma luz. Só ódio. Só discórdia.
E uma Humanidade necessitada
Da tua infinita Misericórdia.

E longe dela, ai de nós pelo que somos.
Pelo caminho ruim que caminhamos.
Pelo que fizemos. Pelo que fomos
E pelo muito que erramos.

Longe da tua Misericórdia, nada.
Ranger de dentes. Choro. Fome. Frio.
A tua Misericórdia é a luz da nossa estrada,
Cesto de peixe que nunca está vazio...

Aqui estamos, pois. Muito cansados.
Já não suportamos tanto sofrimento.
Aqui estamos, ajoelhados,
Diante do teu nascimento.

VIII
Mas é Natal, e assim,
Ecos dos Anjos
Ainda fazem-se ouvir
Em seu Louvor...
Ecos que anunciam
A Boa Nova:
_Eis que hoje vos nasceu
O Salvador.

Eis que é Natal.
E as vozes dos Anjos vibram.
Cânticos de Anjos
Em Legião
Dizendo:
_Hosana... Nasceu Jesus,
Alegrai, pois,
Vosso coração...

Eis que é Natal
E, por ai, pastores
Ainda se alegram
Com a anunciação...
Vibram e falam
Uns para os outros,
E alguns se postam
Em oração...

Que delicado
O cântico dos Anjos,
Escuta-se ao longe
Um trecho seu:
_Gloria a Deus nas alturas
E paz na Terra...
Jesus nasceu...

Santificada essa Boa Nova,
Iluminada essa hora
Como a esperança que se renova:
Toda alegria
Ao mesmo tempo
Agora...

É terna e pura a luz da tua estrela,
Silenciosa e serena,
E vê quem tem olhos de ver seu brilho,
Como quem entende um poema...

Acolhedora a tua manjedoura,
Tão pouco e ao mesmo tempo tanto, tanto...
Impressionantemente acolhedora
Como se fosse teu manto...

Suave e belo o significado
Da tua mensagem de amor,
Ao mesmo tempo imenso, delicado
E inexplicavelmente acolhedor...

Simples pastores por companhia,
Delicadeza, naturalidade...
De onde trouxeram tanta alegria
E tanta felicidade?

E a musica que cantam, como um coro
De varias vozes e grande harmonia,
Como quem cuida um tesouro,
Como se fossem os próprios José e Maria?

A musica que cantam... Que serena...
Retalhos inteiros feitos de paz...
Encantador recordar esta cena
Dos teus primeiros Natais...

E a gruta acolhedora, teu resguardo...
A manjedoura... Nenhuma ostentação...
Nem luz, nem brilho e, no entanto, nenhum fardo...
Nenhuma pena... Nenhum senão...

A gruta, feita de simplicidade...
Nenhum Palácio significa tanto...
Não há vestígios de suntuosidade,
Há, sim, sinais de que é um lugar santo...

IX
E dois mil longos anos se passaram...
Aqueles que, como nós, te conheceram,
Durante esse tempo se desviaram
E após tantos desvios se perderam...

E em dois mil longos anos que afastaram
Da tua presença os que viram e não creram,
Multiplicaram-se os que te negaram,
Espalharam-se os que não te receberam...

E dois mil anos não foram bastante
Para que nós chegássemos aqui diante
De ti como em outra época Simeão...

Os nossos olhos, endurecidos,
Envoltos em trevas, escurecidos,
Ainda não compreenderam a tua lição...

X
Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo,
Caminho, verdade, vida,
Recebe nossa alma vazia nessa hora,
Pela tua Misericórdia, estremecida...

E permanece nosso pensamento assim:
Magnificado e em lagrimas submergido...
Deixamos lá fora as sandálias, o pó ruim,
Trazemos o pensamento enternecido,

Exatasiado com tua singeleza,
Complexa, imensa e cheia de verdade,
Admirados com a força gigantesca
Da tua aparente fragilidade...

Trazemos, humilhado,
O coração cansado,
Trazemos, destruído,
O coração sofrido,
Trazemos, derrotado,
O coração errado,
Trazemos, combalido,
O coração doído...

XI
Insufla nossa boca
Com teu sopro santo,
Fazendo-a cheia
Das palavras de Simeão:
Podemos partir,
Desde agora,
Porque nossos olhos
Viram
A salvação...

XII
Senhor Jesus,
Feliz Natal.
Nos Céus
Os Anjos
Dizem:
_Amém...
Cantando:
_Glória a Deus nas alturas
E Paz na Terra
Aos homens
A quem ele quer bem...

Que assim seja...