17.2.02

A palavra

Eu procurava a palavra
Pra te dizer um poema...
Que fosse sinceridade,
Que fosse toda verdade,
E que dissesse toda forma de beleza:
Surpresa...
Que fosse alicerce e sonho,
Realidade e delírio,
Fragilidade e firmeza,
Navalha cheia de delicadeza,
Fortaleza e mansidão...
Ao mesmo tempo toque e alumbramento,
Como se fosse tudo ao mesmo tempo...
Ao mesmo tempo corpo e coração...
E fosse assim: comum e raridade:
Verdade...
Que fosse rica de aromas,
Fosse pródiga de cores,
Que suportasse os olhares,
Os mal-dizeres, e as dores,
Que superasse todas as distancias,
Que desprezasse toda incoerência,
Ignorasse arrogancias,
Pairasse acima da maledicência:
Inocência...
Que se cantasse em silencio
Como canção de ninar,
Que encantasse a quem ouvisse,
E que ela fosse
Delicada de cantar...
Completamente envolvente e imprecisa,
Como uma ponta de brisa,
Como quem pisa uma nuvem de levinho,
Como se fosse escrita de mansinho:
Carinho...
E quando a voz, num suave movimento,
Resolvesse, de repente, pronuncia-la,
Não conseguisse dize-la,
Emudecesse a sua fala,
E só ousasse, então, nesse momento,
Quando a voz quase se cala,
Sussurra-la em pensamento:
Sentimento...
Que fosse coisa miudinha,
Pedra rara de encontrar,
E ao mesmo tempo
Gigantesca como o mar...
Muito simples de entender
Mas quase sempre
Impossível de ensinar:
Amar...
E procurando a palavra, que eu buscasse
Em toda parte que eu imaginasse:
Que eu vasculhasse os desertos,
Enfrentasse as tempestades,
E fosse ao sol mais longe e ao chão mais perto,
Aos estreitos estranhos e às ruínas,
E aos parques mais distantes da cidade,
E me metesse em cascatas e colinas,
Que eu madrugasse em neblinas,
Contra-luzes, contra-mão,
Ignorasse buzinas,
E que ao cruzar as esquinas
Não percebesse a canção...
Como quem sente uma sede nordestina,
Como quem sonha com a fonte cristalina,
Como quem quer liberdade na prisão:
Coração...
Eu procurava a palavra
Toda feita da surpresa que desperta...
Derramando inocência e poesia...
Resumindo a verdade mais completa...
Transbordando carinho a cada dia...
Quase que só sentimento...
Quase feita só de amar...
Que fosse só coração essa palavra
Que eu estava a procurar...
Eu procurava a palavra
Perfeita pro teu poema
Quando encontrei o teu nome.
Silencio.
Fala baixinho.
Soletra devagarinho.
Parece quase que nada.
Escuta
Como quem ouve
Sozinho
Os ventos da madrugada...
Silencio.
Não diz mais nada.
Só cale.
Mas não arrisque qualquer coisa que atrapalhe...
E sonha feito um menino...
Porque o teu nome tem a força de um destino...
Eu procurava a palavra
Pra te fazer um poema
E sem saber das coisas que eu diria...
Uma palavra que fosse uma poesia...
Desses poemas de fazer sonhar...
E desses sonhos de fazer sorrir...
Eu procurava a palavra
Que era a palavra de eu te oferecer...
E era a palavra só de te agradar...
Qual nada...
Já não procuro a palavra...
Porque a palavra incomum que eu procurava
Chegou ate a mim sem eu sentir...
Eu procurava e ela me observava...
Hoje a poesia passeia aliviada
Falando somente em ti...

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