I
Recorda a Humanidade, neste dia
Os fatos que cercaram Tua chegada:
O Anjo anunciando-Te a Maria,
José quando acolheu a sua amada.
De Nazaré a Belém, Tua romaria,
Onde não havia vaga na pousada,
O Teu nascimento numa estrebaria,
A manjedoura, Tua primeira morada...
Recorda a Humanidade, entre louvores,
Os Anjos anunciando-Te aos pastores,
Os magos e Herodes, a adoração e o
medo...
Recorda a Humanidade nessa hora
Os primeiros movimentos da Tua história
Imensa e encantadora desde cedo...
II
Desde aqueles dias
Já se vão dois mil anos...
Do mesmo modo
Como os pastores,
Aqui estamos...
Soubemos da Boa Nova
E aqui viemos
Como fizeram os pastores
Há dois mil anos...
E, como os pastores,
Nós nos sabemos
Pobres seres humanos,
Nada possuímos
Nem trazemos,
Como os pastores
Há dois mil anos...
Não viemos,
Como os pastores,
Tão logo e assim que soubemos...
Nós nos atrasamos...
Mas aqui estamos
Na Tua presença e,
Por tão pequenos,
Silenciamos...
E assim, orando,
Nós nos ajoelhamos,
Como os pastores
Nós nos alegramos,
Como os pastores
Há dois mil anos...
III
E aqui estamos de mãos vazias...
O que intencionávamos trazer perdemos
Com companhias, com teorias,
Com coisas que valiam menos...
E aqui estamos.
Não trazemos nada.
O que tínhamos ficou pelo caminho.
Nós nos dispersamos pela caminhada
E caminhamos em desalinho...
E aqui estamos. Nada trazemos.
Nem mirra, nem ouro e nem incenso...
Pelo caminho nós os perdemos
E nos restou esse vazio imenso...
E aqui estamos.
Nós nos dispersamos.
Nós nos atrasamos.
Mas aqui viemos.
Já se passaram mais de dois mil anos
E ainda não aprendemos...
Aqui estamos.
Ajoelhados.
De mãos vazias.
Em pensamento.
Aqui estamos, muito cansados,
Diante do Teu nascimento.
IV
O ouro que traríamos,
Valioso,
Peça imponente,
Belíssima cor,
Recebeu tantas ofertas
Nesses dias
Que o trocamos
Sem nenhum pudor
Por bugigangas,
Quinquilharias,
Sem garantias,
Coisas sem valor:
Bijuterias,
Peças sem valia,
Pedras sem brilho
E sem nenhum teor...
Gastamos todo
Com ninharias,
Trocamos,
Demos
E esquecemos
De repor...
Hoje não temos
Mais do que a lembrança
Do que já tivemos
E, além disso,
Dor...
E porque gastamos,
E porque perdemos,
Comportamo-nos
Como o mau pastor
Que se descuida
Do que seria
Para cuidar
Como bom cuidador...
Aqui estamos
De mãos vazias,
Nada mais temos,
Nada nos restou...
De mãos vazias
Aqui estamos...
Vazios
Na presença Do Senhor...
V
O aroma leve de um suave incenso
Nós preparamos para trazer.
Aspecto doce, odor delicado,
Especificamente preparado
Para o menino que viemos ver.
Foi quando até aqui, pelo caminho,
Outros aromas doces conhecemos,
Por outros cheiros nos atraímos,
Outras essências sentimos,
Outras fragrâncias colhemos
E o aroma leve do incenso suave
Que preparamos foi se perdendo
E como a água quando escorre pelo ralo
Já não nos é possível agora identificá-lo...
_O que é que andamos fazendo?
Por outros cheiros nos seduzimos,
Outros perfumes vulgares,
Azedos, acres, fáceis, sedutores,
Odores oferecidos, maus odores,
Dezenas e centenas e milhares...
E assim o símbolo de tua espiritualidade
Contaminamos em nossa caminhada...
Estúpidos condutores, e descuidados,
E incautos, fomos contaminados
E hoje trazemos a alma infectada...
E o aroma suave do incenso doce
Já não possuímos nesse momento...
Envolve-nos, Senhor, com tua essência,
Ajoelhados, na Tua presença,
Reverenciando Teu nascimento...
VI
A mirra, preparamos com carinho
E embalamos cuidadosamente...
O sofrimento é parte do caminho...
A dor é sempre presente...
Mas donos de um cuidado tão mesquinho,
De um jeito tão displicente,
Bastou o primeiro copo de vinho
E o primeiro gole amargo de
aguardente,
E a mirra a derramamos e a perdemos,
A dor embriagada dói bem menos...
Desrespeitamos Teu sofrimento...
E hoje aqui, não mais tão embriagados,
Postamo-nos diante de Ti, ajoelhados,
Diante do Teu nascimento...
VII
Submersos em trevas e isolados,
Por desacertos nos conduzimos...
Enfraquecidos, tolos, derrotados
Que a nós mesmos nos destruímos...
A sombra, como semente alimentada,
Cresceu e se espalhou, erva daninha...
A Humanidade quedou-se, acinzentada,
Perdeu o rumo, perdeu a linha...
O desafeto e o desamor, unidos,
Tornaram-se gestos diários
Que os homens fracos e os distraídos
Trataram como comportamentos
necessários...
E assim, do desamor nasceram a usura,
A ira torpe, a falta de perdão,
O ódio entre a criatura e a criatura
E a rudeza do coração...
Mísseis cruzando os céus, caças insanos,
Botões dizimando nações sem piedade,
Homens selvagens, seres humanos
Vestidos de pura bestialidade...
A morte provocada pela guerra,
O lucro à custa da crueldade,
A sombra assustadora sobre a Terra
Ameaçando a Humanidade...
Flagelo.
Fome.
Miséria.
Medo.
Terror.
Suspeita.
Desamparo.
Dor.
O homem que vive entre feras desde cedo
Fica contaminado por esse horror.
A que chegamos...
Não sobrou nada.
Nenhuma luz.
Só ódio.
Só discórdia.
E uma Humanidade necessitada
Da Tua infinita Misericórdia.
E longe dela, ai de nós pelo que somos.
Pelo caminho ruim que caminhamos.
Pelo que fizemos.
Pelo que fomos
E pelo muito que erramos.
Longe da Tua Misericórdia, nada.
Ranger de dentes.
Choro.
Fome.
Frio.
A Tua Misericórdia é a luz da nossa estrada,
Cesto de peixe que nunca está vazio...
Aqui estamos, pois.
Muito cansados.
Já não suportamos tanto sofrimento.
Aqui estamos, ajoelhados,
Diante do Teu nascimento.
VIII
Mas é Natal, e assim,
Ecos dos Anjos
Ainda fazem-se ouvir
Em Seu Louvor...
Ecos que anunciam
A Boa Nova:
_Eis que hoje vos nasceu O Salvador.
Eis que é Natal.
E as vozes dos Anjos vibram.
Cânticos de Anjos
Em Legião
Dizendo:
_Hosana...
Nasceu Jesus,
Alegrai, pois,
Vosso coração...
Eis que é Natal
E, por aí, pastores
Ainda se alegram
Com a anunciação...
Vibram e falam
Uns para os outros,
E alguns se postam
Em oração...
Que delicado
O cântico dos Anjos,
Escuta-se ao longe
Um trecho seu:
_Glória a Deus nas alturas
E paz na Terra...
Jesus nasceu...
Santificada essa Boa Nova,
Iluminada essa hora
Como a esperança que se renova:
Toda alegria
Ao mesmo tempo
Agora...
É terna e pura a luz da Tua estrela,
Silenciosa e serena,
E vê quem tem olhos de ver seu brilho,
Como quem entende um poema...
Acolhedora a Tua manjedoura,
Tão pouco e ao mesmo tempo tanto, tanto...
Impressionantemente acolhedora
Como se fosse Teu manto...
Suave e belo o significado
Da Tua mensagem de amor,
Ao mesmo tempo imenso, delicado
E inexplicavelmente acolhedor...
Simples pastores por companhia,
Delicadeza, naturalidade...
De onde trouxeram tanta alegria
E tanta felicidade?
E a música que cantam, como um coro
De várias vozes e grande harmonia?
Como quem cuida um tesouro,
Como se fossem os próprios José e
Maria...
A música que cantam... Que serena...
Retalhos inteiros feitos de paz...
Encantador recordar esta cena
Dos Teus primeiros Natais...
E a gruta acolhedora, Teu resguardo...
A manjedoura... Nenhuma ostentação...
Nem luz, nem brilho e, no entanto, nenhum fardo...
Nenhuma pena... Nenhum senão...
A gruta, feita de simplicidade...
Nenhum palácio significa tanto...
Não há vestígios de suntuosidade,
Há, sim, sinais de que é um lugar
santo...
IX
E dois mil longos anos se passaram...
Aqueles que, como nós, Te conheceram,
Durante esse tempo se desviaram
E após tantos desvios se perderam...
E em dois mil longos anos que afastaram
Da Tua presença os que viram e não creram,
Multiplicaram-se os que Te negaram,
Espalharam-se os que não Te
receberam...
E dois mil anos não foram bastante
Para que nós chegássemos aqui diante
De Ti como em outra época Simeão...
Os nossos olhos, endurecidos,
Envoltos em trevas, escurecidos,
Ainda não compreenderam a Tua lição...
X
Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo,
Caminho, Verdade, Vida,
Recebe nossa alma vazia nessa hora,
Pela Tua Misericórdia, estremecida...
E permanece nosso pensamento assim:
Magnificado e em lágrimas submergido...
Deixamos lá fora as sandálias, o pó ruim,
Trazemos o pensamento enternecido,
Extasiado com Tua singeleza,
Complexa, imensa e cheia de verdade,
Admirados com a força gigantesca
Da Tua aparente fragilidade...
Trazemos, humilhado,
O coração cansado,
Trazemos, destruído,
O coração sofrido,
Trazemos, derrotado,
O coração errado,
Trazemos, combalido,
O coração doído...
XI
Insufla nossa boca
Com Teu sopro santo,
Fazendo-a cheia
Das palavras de Simeão:
Podemos partir,
Desde agora,
Porque nossos olhos
Viram A salvação...
XII
Senhor Jesus,
Feliz Natal!
Nos Céus Os Anjos Dizem: _Amém...
Cantando:
_Glória a Deus nas alturas
E Paz na Terra
Aos homens
A quem Ele quer bem...
Que assim seja...