25.4.05

O Amar

Estranha criatura. E traiçoeira.
E atraente. E doce criatura.
Cruel, como é cruel a ratoeira.
Sublime, como é o balsamo que cura.

Cheia de ardis, feito uma feiticeira,
E dos misterios de uma noite escura,
É, como a brisa, às vezes, passageira,
Às vezes não , como uma sepultura.

Mortal e ao mesmo tempo alvissareira,
Mistura o gesto bom, como é o da freira,
Com o doloroso, como é o da sutura...

Estranha criatura. E como cheira
Vulgar, às vezes, como uma rameira,
E algumas outras tão suave e pura...

24.4.05

A Professora
Dedicado à Professora Regina Tonelli por seus empenho e dedicação ao fazer a correção de meu livro A Palavra Dada, no prelo.
À Professora Regina, em nome de todas as professoras, com carinho.

A professora, perfeição plástica,
Caminha, exatidão aritimética,
Levando a autoridade da gramática
E a delicadeza da poética...

Abrasando pronomes abusivos,
Vai, dissolvendo as silabas a mais,
Trocando de lugar os substantivos,
Contendo os singulares e os plurais,

Cauterizando excessos descritivos,
Simplificando os textos mais complexos,
Limpando os tempos verbais imperativos,
Acrescentando acentos circunflexos,

E segue adiante a professora, segue
Por entre consoantes e vogais,
O olhar astuto, a palavra leve,
Podando as concordancias nominais,

Detém-se ante os paragrafos e os hiatos,
Define e reorganiza as concordancias,
Corrige os substantivos abstratos
Pulverizando as exorbitancias...

E, um apos outro, curetando excessos
E descontaminando os maus ruidos,
Faz com que os versos maus se tornem versos
Maravilhosamente bons para os ouvidos...

A professora, a retidão, a regra,
O polimento da aspereza, o brilho,
Como quem dá o corte à faca cega,
Como quem veste e arruma o próprio filho...

E assim, redescobrindo o brilho oculto
Entre os escombros da palavra fria,
Faz, como quem lapida o mármore bruto,
Como quem planta mudas de harmonia...

A professora... Quem mais poderia?

10.4.05

Cadê o salário?
Aos colegas médicos pediatras da Unidade Neonatal do Hospital dos Plantadores de Cana de Campos que estão sem receber desde janeiro.

Um mês sem...
Dois meses sem...
Três meses sem...
Se a gente não faz nada
Esse salário só sai pro mês que vem...
Luna ta quase tendo nenem,
Daqui a pouco Isabel quer um também,
O Anderson ta pensando em ter mais cem,
A Débora e a Karina... O que é que tem?
Não é pra isso que existe o gen?
Mas o salário...
Nem...
Um mês sem...
Dois meses sem...
Três meses sem...
Muito ti-ti-ti,
Muito blá-blá-blá,
Muito nhem-nhem-nhem...
Mas pagar mesmo
Quem tem que pagar não paga
Porque dinheiro não tem,
Quem tem que assumir promete
Promessas pra mais além,
O cheque já foi assinado...
Mas quem autoriza?
Quem?
Um mês sem...
Dois meses sem...
Três meses sem...
Se a gente não grita, se fica entocado,
Vai acabar feito Sadam Houssain
Desprevenido e mal pago
Vendo o Bush se dar bem.
Eu sempre soube que o touro
Só segue pro matadouro
Porque não faz nem idéia
Da grande força que tem.
Entendeu bem?
Um mês sem...
Dois meses sem...
Três meses sem...
A gente ta que nem Pedro Pedreiro
Esperando o dinheiro desde o ano passado
Para o mês que vem.
Sem essa, vamos embora,
Esperar? Por que? Por quem?
Quem sabe é que faz a hora.
Não fica esperando o trem...
Quem espera
Só se desespera.
Vem brigar com a fera...
Vem...
Um mês sem...
Dois meses sem...
Três meses sem...
Dinheiro não evapora.
Ta sempre na mão de alguém.
Salário tem que ser pago
Sem faltar nenhum vintém.
Quem espera sentado nunca alcança.
Quem não tem procura,
Quem procura acha,
Quem acha tem
Por isso para de dizer amém
Pra um mês sem...
Dois meses sem...
Três meses sem...
Pois quem se humilha
Por que é seu direito
E julga que lutar
Não lhe cai bem
Nem é um homem
É um capacho,
É um borra-botas,
É um pau-mandado,
Não tem nem nome,
É um ninguém...

6.4.05

Sobre o amor precioso que tu amas

Perguntaram-me mil vezes:
_O que é o amor?
Eu te garanto:
Não acertei nenhuma delas...
Tivesse visto o teu sorriso antes
Eu saberia ao menos
De quem colar
A resposta.